Ribadouro - AzimuTTe Zero

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Ribadouro

Todo-o-Terreno
AzimuTTe: Ribadouro

10/11 de Julho de 2021

 
     O Tempo é um conceito relativo. Este é um chavão por demasiado usado: o Tempo voa quando nos sentimos felizes; o Tempo pára quando algo de horrível nos acontece; o Tempo arrasta-se quando temos que fazer algo desagradável. Talvez a única verdade seja esta última apropriação: o Tempo não pára. E há um limite para o que se consegue fazer num determinado intervalo de tempo. Quando o inesperado acontece, deixa de ser possível fazer o que se tinha planeado. Nessa situação, não há como recorrer aos grandes Monty Python: ‘adopt, adapt and improve’.
--X--
     A propósito de Lazarim, do Carnaval e das suas máscaras, há quem advogue que já se carrega uma máscara o ano inteiro, para quê, então, usar outra durante quatro dias? Talvez seja verdade, que carregamos máscaras, mas, a ser assim, como descobrir a verdadeira face de cada um? Uma situação inesperada, extrema ou anormal, que não dê tempo de a colocar? Que deixe a verdadeira personalidade saltar, finalmente liberta, para a tona, bem à vista de todos?
--X--
    O termómetro do carro acusa 35ºC de temperatura exterior. O ar encontra-se parado, como se o dia tivesse exalado o último suspiro. A matina começou não propriamente fresca, mas agradável, ainda assim. Porém, esse começo já leva umas bem preenchidas horas de velho. Os corpos, sacudidos por calçadas velhas de séculos, acusam algum cansaço que o atraso para o almoço não fez mais do que acentuar, pese embora a animação das visitas da manhã. O almoço, apesar de volante, foi lauto, ou não fossemos nós portugueses (um dos meus bisavós era francês e talvez isso explique a minha frugalidade, que é de sempre). A parte da tarde pedia um início que não incomodasse a digestão de tanto intercâmbio de vitualhas. Por tudo isto, seria, porventura, desculpável que alguém não tivesse grande disponibilidade para algo inesperado que pudesse surgir (nos muitos anos que levo de vida e já alguns largos de todo-o-terreno, já vi muito).
         
      E o inesperado aconteceu!
              
     Como nos Extras de um filme em DVD, pode-se escolher o início para o relato deste AzimuTTe por terras de Ribadouro. Todos eles conduzem ao importante do argumento.
 
      Sim, o inesperado consumiu-nos tempo que nos levou a Adoptar outra estratégia, a Adaptar o programa inicial e a Melhorar o que sobrou.
 
    Sim, o inesperado podia ter posto a nu personalidades desconhecidas, mas não surpreendeu ninguém que, afinal, não carregássemos máscaras. O que nos apercebemos de cada um é o que é real e que a amizade, boa disposição e espírito de entre-ajuda imperaram.
 
     Sim, o inesperado, cozinhado no fogo lento do calor sufocante e da farta comida, quando transbordou, podia ter entornado alguns ‘caldos’, mas nem sequer beliscou os ânimos.
 
    No fundo, muito me teria surpreendido o contrário ou não conhecesse eu bem, há já tempo suficiente, este magnífico grupo, e entre estas linhas reside o importante do argumento. E António, as tuas preocupações (que muito te honraram), como te disse, careciam de fundamento.
 
     
   Quanto ao resto, retemos na memória, com vontade de voltar por épocas de Entrudo, Lazarim e o seu CIMI-Centro de Interpretação da Máscara Ibérica, a simpática guia e o não menos simpático, galardoado e virtuoso da madeira de amieiro, artesão Rui Costa; a ‘Casa da Cadeia’, em Lalim; a capacidade empática da guia na Capela de São Pedro de Balsemão, em Balsemão; o próprio rio Balsemão, que nos levou até à Capela, e o rio Varosa que da Capela nos levou; o sinuoso troço, como se seguíssemos o registo em papel de uma arritmia, da icónica E.N. 2; o delírio barroco do Santuário de Nossa Senhora dos Remédios e a antipatia de algumas das beatas de turno na Sé, em Lamego; o jantar à beira do Douro, com a música ao vivo a embalar as animadas conversas; a experiência que é olhar para as Igrejas de Santa Maria de Barrô e São Martinho dos Mouros com o sol, cansado do exercício matinal de vencer os montes, surgindo por trás delas, como se já não fosse emocionante o suficiente deleitarmo-nos com a sua arquitectura; os cabos de alta tensão que perturbam a soberba vista que se desfruta do Nicho do Imaculado Coração de Maria, em São Martinho dos Mouros; esta região de montanhas a perder de vista, de constante  sobe-e--desce; a omnipresença do rio Douro, umas vezes visto bem lá de cima, onde se encaracola a fabulosa E.N. 222, outras vezes visto literalmente da sua margem, onde aquela estrada se estira; o domesticado por vinhedos, mas cada vez mais selvagem e agreste e magnífico, à medida que se vai subindo, vale do rio Távora; e, a terminar, qual pièce de résistance, essa pequena e singular jóia, de erma localização, desafiando o bom senso e com uma riqueza pétrea decorativa que emociona até a alma mais empedernida para as coisas da arte e que dá pelo místico nome de Igreja de São Pedro das Águias.

   Rumando a Sul, a caminho de casa, tudo isto me cruza a mente e me sinto um felizardo por levar o carro tão cheio de excelentes memórias. E o termómetro que teima nos 35º… Já tinha mencionado que tenho o ar condicionado avariado?

    Agradecimentos, por nenhuma ordem em particular: às minhas boas amigas Lurdes Pereira, em Barrô, e Sónia Meneses, em Peso da Régua, sempre disponíveis e que me ajudaram com a logística e me facilitaram contactos; ao CIMI e ao artesão Rui Costa, em Lazarim, pelo simpático acolhimento e disponibilidade; ao Museu Municipal de Lamego, pela abertura e visita guiada à capela de São Pedro de Balsemão; à Rota do Românico, pelas visitas que disponibilizaram; à Câmara Municipal de Lamego, pela reserva de estacionamento; e a todos os participantes, por o terem sido e pelas fotos, anónimas quanto à autoria, que me chegaram.
 
    Um bem-haja a todos!
Texto: Nuno Furet
Fotos: Vários autores
 
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